domingo, 5 de junho de 2011

ANTI-HEROÍNAS

Se todos usam máscaras


(plagiando batman)

Insisto na mulher gato

De quem batgirl

Nunca chegou aos pés.

Afinal, desde Eva,

Heroína boa é heroína má.

por Adriana Barbosa

VOCÊ HABITA O MUNDO QUE PASSA NO JORNAL?

Será o mundo assim, uma bola confusa, onde acontecem unicamente desastres e desgraças? Não! Os jornais é que falsificam a imagem do mundo.


Rubem Braga




A epígrafe acima é parte de uma crônica de Rubem Braga intitulada Os jornais, que foi mote para uma atuação de bolsistas do subprojeto de Letras do Programa Institucional de Iniciação à docência da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia(UESB) nesta última semana de março na biblioteca do Instituto de Educação Régis Pacheco(IERP). A escolha da crônica para realização de atividade de leitura se deu pela iniciativa dos alunos do segundo ano do ensino médio da referida escola em anunciarem seu desejo de criação de um jornal dos estudantes.

Pois bem, quem é meu leitor sabe que essa coluna sugere leituras, não necessariamente apenas de textos escritos. Então, pergunto-me, afinal o meu convite à leitura desse mês será para lermos o quê? A crônica acima mencionada (boa idéia); o desejo dos alunos do IERP em criarem seu próprio jornal (idéia melhor ainda); os efeitos da leitura da crônica sobre os alunos (inusitado); ou ainda todo um cenário contemporâneo sobre o papel do jornal hoje em nossas vidas (como sugere o título)?

Todas as perguntas acima me interessam. Vamos por partes então: é claro que recomendo a leitura de Rubem Braga, não apenas desta crônica, mas de sua obra. Mas nesta crônica, o olhar poético do cronista exige que desconfiemos da realidade exposta pelos meios de comunicação. Mais ainda, ele nos lembra que coisas fascinantes acontecem e não aparecem no jornal, como por exemplo, muitos acontecimentos da sua vida, leitor, que em sua opinião, certamente, mereciam manchete ou capa de revista. A crônica também tem o mérito de nos fazer refletir sobre quem determina o que deve / pode sair no jornal. E ainda se devemos e podemos acreditar em tudo que nele vem publicado.

Ora, o fato histórico jequieense que não vai sair no jornal, mas ganhou espaço na Cotoxó, é que alunos de ensino médio da escola pública brasileira desejem criar um jornal, sendo eles, alunos, na maioria das vezes, acusados por professores, diretores e o senso comum de não saberem ler e escrever. Ora o que pretendem eles que supostamente não sabem e nem gostam de ler e escrever com um jornal? Vai dizer que isso não seria um fato que merecia destaque, ao menos na imprensa local.

Convidamos os alunos de todas as turmas do segundo ano do IERP, para uma atividade na biblioteca. Entregamos a crônica impressa e uma das bolsistas começou a ler. O público no inicio disperso, voltando da merenda, conversando, vai silenciando aos poucos e acompanhando a leitura com os olhos no papel. Em instantes ocorre a magia. Adolescentes cativados pelo estilo de escrita do cronista que ao imitar a linguagem da noticia vai desfilando fatos nada noticiáveis, entre eles: “Na manhã seguinte Augusto Ramos foi visto saindo de sua residência às 07h45min da manhã, isto é, dez minutos mais tarde do que o habitual, pois se demorou, a pedido de sua esposa, para consertar a gaiola de um canário-da-terra de propriedade do casal". Fisgados pelo texto (quem diria o texto esse objeto de desejo), após a leitura em voz alta da bolsista, a turma aplaudiu, dando aquele momento um caráter de espetáculo e de arte. Que sensibilidade desses alunos que o senso comum acredita que não gostam de ler.

Vale também lermos a perspicaz interpretação de uma das alunas, quando perguntada sobre a mensagem principal do texto. Ela comenta: “a crônica diz que no jornal só saem as misérias da vida.” Desautorizando Braga, talvez inconscientemente, a aluna faz o que todo professor de língua deseja, vai além do que diz o texto, coloca-se na leitura, pois o autor ao afirmar que: “Porque os jornais noticiaram tudo, tudo, menos, uma coisa tão banal de que ninguém se lembra: a vida...”, não reconhece na vida as misérias das quais a aluna nos lembra. De fato, a vida também é feita de misérias. Ela está coberta de razão. E talvez não caibam neste começo de novo milênio apenas o olhar poético-romântico do cronista do século passado que nega as misérias da vida ao focar apenas o seu lado belo.



Mesmo assim, reconhecendo os cenários nada esperançosos que passam na TV, é preciso também olhar o que não é miséria e insiste em nos rodear. Em meio às últimas catástrofes, quantos voluntários e doações. Na luta contra o câncer, um político nos humaniza. Em pleno sucateamento das universidades estaduais baianas pelo governo Wagner, o movimento estudantil da UESB nos ensina uma lição. Esse mundo também nos interessa. E fica a expectativa em relação ao jornal dos alunos do IERP, de que mundo ele nos falará?

por Adriana Barbosa